Novembro | 2021

O Espírito em busca da consciência de quem ele é, de evolução e da reconciliação consigo mesmo, guarda a dor de não ser compreendido

A solidão dos montes

Ailton Barcelos da Costa

ailton.barcellos@gmail.com

Em início de jornada, já tomando consciência de seu papel como filho do Criador, o ser pode experimentar a solidão, pois ainda não se desvencilhou do passado, do seu velho ser

 

O espírita que pratica, ou pelo menos vem esforçando-se para praticar o Evangelho do Cristo, é um ser reencarnado que carrega um grande fardo sobre os ombros, pois dentro de sua alma leva a herança das três revelações divinas: Moisés, Jesus e Kardec. O Evangelho Segundo o Espiritismo nos diz que, na primeira, a humanidade aprendeu os fundamentos da justiça divina; na segunda conheceu a primeira letra do alfabeto divino, o amor; na terceira conheceu a segunda letra do alfabeto divino, a reencarnação.

Mas quais consequências para a vida do Espírito implicam tais revelações?

O impacto desse conhecimento é brutal para o Espírito, seja ele encarnado ou desencarnado, e muda sua vida para sempre, porque agora o horizonte se expande ao infinito. Ele passa a não ter mais a percepção de uma única vida, limitada e material, mas a ter a consciência de uma única vida, a eterna, e a enxergar todas as encarnações e a vida no mundo espiritual como uma única existência. Logo, sua responsabilidade para consigo mesmo e com próximo se expande, uma vez que tudo que ele faz terá consequências e arcará necessariamente com seus atos, por piores ou melhores que sejam.

Passa-se agora a não ver mais as fronteiras da matéria e do espaço, pois o Espírito faz parte de uma grande escala evolutiva, em que todos os reinos da matéria e todos os seres do Universo, que antes eram estranhos, agora tomam a todos como irmãos.

Para Emmanuel, em Fonte Viva, o Espírito em busca da consciência de quem ele é, em busca de evolução e da reconciliação consigo mesmo, guarda a dor de não ser compreendido, buscando uma espécie de renascimento, igualmente doloroso. Para a mesma obra, à medida que te elevas, monte acima, no desempenho do próprio dever, experimentas a solidão dos cimos e incomensurável tristeza te constringe a alma sensível.

Para A Gênese, tal renascimento espiritual, em que o velho homem, o velho Espírito morre e passa a dar lugar ao novo ser, que se esforça por fazer bem, não é tarefa simples, pois são dezenas de vidas dedicando-se a comportamentos infelizes e degradantes. Entre estes se encontram os comportamentos egoístas, de só pensar em si e desprezar os demais seres de sua convivência, que têm, por consequência, inúmeros delitos com a consciência.

De fato, são inúmeros seres encarnados e convivendo na nossa sociedade que só vivem para si, cometendo toda a sorte de pequenas iniquidades, pensando em levar vantagem em tudo. São seres que não respeitam e não têm consciência da grave situação do meio ambiente global, e que atitudes solidárias de cada um podem fazer a diferença. Além disso, André Luiz os descreve em sua vasta obra como “seres fisiológicos”, cuja característica primordial é viver para satisfazer todos os sentidos do corpo, já que acreditam que precisam gozar sua única vida, ou seja, cometem toda sorte de abusos dos sentimentos ou na alimentação.

A solidão, como citada por Emmanuel, ocorre para o ser que está no início dessa jornada, que já está tomando consciência de seu papel como filho do Criador, mas ainda não se desvencilhou desse passado, do velho ser. O encarnado nessa condição busca de toda forma desvencilhar-se dos vícios ou se esforça para não mais cometer pequenas corrupções, e naturalmente os demais seres, aqueles “fisiológicos”, acabam se afastando. Expressa de forma brilhante o referido autor: “Choras, indagas e sofres... Contudo, que espécie de renascimento não será doloroso?”

Aqui o ser em busca da árdua ascensão muitas vezes experimenta períodos de solidão física, afastamento de antigos companheiros, mas também sente piedade por aqueles que ainda não entendem o verdadeiro caminho evolutivo. Por outro lado, ao iniciar seu renascimento, essa solidão, posta a serviço dos semelhantes, gera grandeza e satisfação do dever cumprido, e não mais se sente sozinho, pois tem a certeza de que está acompanhado por inúmeros seres também no caminho da árdua ascensão, como nos diz Emmanuel. Para o autor:

“Não te canses de aprender a ciência da elevação. Lembra-te do Senhor, que escalou o Calvário, de cruz aos ombros feridos. Ninguém o seguiu na morte afrontosa, à exceção de dois malfeitores, constrangidos à punição, em obediência à justiça. Recorda-te dele e segue...” (XAVIER, 2020, p. 146)

Por fim, fica claro que o caminho rumo aos montes da evolução espiritual é árduo, principalmente quando o Espírito decide que é o momento de mudar a sua trajetória, uma vez que é solitário o caminho, mas quando ele decide mudar os rumos, passa-se a ter a companhia do Mestre Jesus, e é nesse momento que nunca mais você se sentirá sozinho.

 

- KARDEC, A. A Gênese. Trad. Guillon Ribeiro. 53.ed. Brasília: FEB, 2013.

- XAVIER, F. C. Fonte Viva. Pelo Espírito Emmanuel. 1.ed. 16.imp. Brasília: FEB, 2020.

novembro | 2021

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O Clarim – novembro/2021

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