Agosto | 2019

A criança e a educação sexual

Ailton Gonçalves de Carvalho |

ailtoncarval@gmail.com

As respostas para a curiosidade infantil não podem ser intempestivas e muito menos questionadoras; antes, devem ser contextualizadas.

 

Ao viajar de avião, ouvimos a seguinte instrução: “Em caso de despressurização, máscaras de oxigênio cairão. Coloque primeiro em você e depois auxilie idosos e crianças.”

Podemos então analisar, sob esta óptica, nossas relações intrapessoais. No mundo atual vivemos com uma gama de informações; algumas se tornam conhecimentos e outras não. A internet nos coloca em contato com o mundo sem que precisemos sair do local que moramos. Desde a mais tenra idade, nossas crianças aprendem a navegar em busca de informações que muitas vezes norteiam seu dia a dia.

Pais, professores, evangelizadores e outros que têm a responsabilidade de auxiliar o espírito em seu progresso moral e intelectual estão assustados com o interesse cada vez mais precoce com questões sexuais, por exemplo. Nesse contexto, surge a questão: como nos prepararmos para enfrentar tantas informações sem que sejamos repressores, impositivos e donos da verdade?

Aconteceu um caso bem interessante na escola que trabalho. Uma professora da educação infantil, primeiro período, adentrando na sala de aula flagrou dois alunos (um menino e uma menina) completamente nus – ele deitado sobre ela imitando uma relação sexual. Apavorada, saiu pelos corredores da escola pedindo socorro, alegando que estava ocorrendo uma relação sexual infantil dentro de sua sala.

Ao narrar este fato, muitos se lembrarão de alguma situação parecida envolvendo crianças na temática sexual e imediatamente surgem os questionamentos: O que fazer? Como agir? Que postura adotar?

Retornando o caso do aviso no avião sobre a despressurização, partimos da premissa que antes de lidar com a sexualidade do outro é necessário lidar primeiramente com a nossa. Joanna de Ângelis ensina:

Aos pais cabe a tarefa educativa inicial. Todavia, mal equipados de conhecimentos sobre conduta sexual, castram os filhos pelo silêncio constrangedor a respeito do tema, deixando-os desinformados, a fim de que aprendam com os colegas pervertidos e viciados, ou os liberam, ainda sem estrutura psicológica, para que atendam aos impulsos orgânicos, sem qualquer ética ou lucidez a respeito da ocorrência e das suas consequências inevitáveis. Quando se pretende transferir para a Escola a responsabilidade da educação sexual, corre-se o risco, que deverá ser calculado, de o assunto ser apresentado com leveza, irresponsabilidade e perturbação do próprio educador, que vive conflitivamente o desafio, sem que o haja solucionado nele próprio de maneira correta (...).[1]

Estes ensinos nos mostram como pais e professores, vivendo conflitos com a própria sexualidade, se omitem ou utilizam de métodos retrógrados para direcionar o desenvolvimento sexual da criança.

Somos sabedores que a etapa infantil é de suma importância para o espírito reencarnante. É nesta fase que se inicia o processo educativo do ser. Novos ensinos éticos e morais, familiares e religiosos virão modificar aqueles trazidos de outras existências. Desde a mais tenra idade, o espírito apresenta comportamentos que os encarregados de educá-los devem prestar atenção e, como um jardineiro, ir arrancando as ervas daninhas.

O interesse por questões sexuais na infância tem chamado atenção de muitos especialistas. É um fenômeno que não pode ser ignorado, mas enfrentado. O maior desafio é encontrar uma maneira correta de fazê-lo. Joanna de Ângelis esclarece:

Talvez, em razão de ignorarem ou negarem a origem do ser, como Espírito imortal que é, inúmeros psicólogos, sexólogos e educadores limitam-se, com honestidade, a preparar a criança de forma que apenas conheça o corpo, identifique suas funções, entre em contato com a sua realidade física. A proposta é saudável, inegavelmente; todavia, o corpo reflete os hábitos ancestrais, que provêm das experiências anteriores, vivenciadas em outras existências corporais, que imprimiram necessidades, anseios, conflitos ou harmonias que ora se apresentam com predominância no comportamento.”[1]

Aliadas a experiências antigas, temos também situações de vivências atuais. Certa feita, realizando palestra para pais de uma escola pública, fui questionado por uma mãe de como ela deveria agir com seu filho de seis anos, que todos os dias entrava na sala de aula e beijava todas as garotas – e com demonstração de força. Após alguns questionamentos, descobri que o pai era o maior incentivador de tal comportamento, haja vista que, seu filho beijando as meninas nesta idade, com certeza não beijaria homens amanhã.

Quando realizo atividade para professores e pais sobre sexualidade, deixo bem claro que uma pergunta, um jogo ou uma brincadeira com cunho sexual muitas vezes é um pedido de socorro da criança. Walter Barcelos ensina:

“(...) a capacidade de influenciar e a possibilidade de ser influenciada é própria de toda pessoa. Todos influenciam e são influenciados, mas ninguém é mais passível de ser sugestionada, do que a criança. Sua estrutura psicológica absorve e grava tudo, não faz seleção do que se lhe oferece, no campo cultural e moral.”[2]

Desta forma, as respostas para a curiosidade infantil não podem ser intempestivas e muito menos questionadoras – “Quem te disse isso?”; “Onde aprendeu estas coisas?”. Antes, devem ser contextualizadas.

Vivemos, atualmente, numa sociedade em que nossas crianças são erotizadas através de filmes, novelas, danças e tendências da moda. Quantas crianças queimam etapas de crescimento e passam da fase de brincar para a fase de namorar, de beijar, dentre outros comportamentos, possibilitando a maturação sexual “fora de época” com consequências desastrosas, tanto orgânicas quanto emocionais. A criança é atirada prematuramente para a puberdade, sem condições físicas nem emocionais para enfrentar tal situação. Um fator específico desse fenômeno é o alto índice de casos de gravidez na infância.

A primeira e mais importante escola para o ser reencarnante é o lar e os pais seus educadores. A educação deve iniciar-se antes mesmo da concepção. Em relação à educação sexual, Emmanuel, na questão 111 do livro O consolador, ao ser questionado sobre a fundação de escolas para a educação sexual, esclarece:

Os professores do mundo, todavia, considerando o quadro legítimo das exceções, ainda não passam de servidores do Estado, angustiados na concorrência do profissionalismo. Na sagrada missão de ensinar, eles instruem o intelecto, mas, de um modo geral, ainda não sabem iluminar o coração dos discípulos, por necessitados da própria iluminação. Examinada a questão desse modo, e atendendo às circunstâncias das posições evolutivas, consideramos que os pais são os mestres da educação sexual de seus filhos, indicados naturalmente para essa tarefa, até que o orbe possua, por toda parte, as verdadeiras escolas de Jesus (...).”[3]

E ainda fornece valioso ensino acerca desta etapa de desenvolvimento do espírito, ao afirmar na questão 109 do mesmo livro:

“O período infantil é o mais sério e o mais propício à assimilação dos princípios educativos. Até aos sete anos, o Espírito ainda se encontra em fase de adaptação para uma nova existência que lhe compete no mundo. Suas recordações do plano espiritual são, por isso, mais vivas, tornando-se mais suscetível de renovar o caráter e a estabelecer novo caminho, na consolidação dos princípios de responsabilidade, se encontrar nos pais legítimos representantes do colégio familiar. Eis por que o lar é tão importante para a edificação do homem (...).”[3]

Infelizmente, nossas crianças estão crescendo sem referenciais seguros no tocante à sexualidade. Os genitores saíram de um regime educacional repressor – pressão social (castração, superproteção, violência), falta de diálogo, mitos e tabus, indiferença ou omissão – para um sistema banalizador – liberdade excessiva que culmina na libertinagem, promiscuidades de toda ordem, ociosidade. A busca de um modelo, considerado ideal para lidar com o fenômeno sexual infantil, e que se contraponha a esses dois sistemas, tem gerado conflitos de como agir diante de comportamentos sexuais, que se manifestam cada vez mais cedo.

Joanna de Ângelis, no livro Adolescência e vida, esclarece: “Os modelos devem ser silenciosos, falando mais pelos exemplos, pela alegria de viver, pelos valores comprovados, ao invés das palavras sonoras, mas cujas práticas demonstram o contrário.”

Não existe receita de bolo para a educação e aqui em especial para sexual. A melhor receita é procurar leituras sobre o tema e, principalmente, desenvolver sentimentos verdadeiros do querer fazer o seu melhor.

 

  1. FRANCO, Divaldo Pereira. Adolescência. Pelo Espírito Joanna de Ângelis. Salvador: LEAL.
  2. BARCELOS, Walter. Educadores do Coração. Salvador: LEAL.
  3. XAVIER, Francisco Cândido. O consolador. Pelo Espírito Emmanuel. FEB.

julho | 2017

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