Fevereiro | 2022

Cada ideia ou força mental é, de alguma maneira, armazenada na psicosfera do fluido que circula em torno de nós

Cuidado com o “olho gordo”

Marcos Paterra

marcos.paterra@gmail.com

A inveja se processa no cérebro na mesma região que a dor física, ou seja, é literalmente um sentimento doloroso

 

Quando adolescente, meu avô sempre dizia para que eu tomasse cuidado com o “olho gordo”[1], com exibicionismos ou a quem contava sobre minhas aquisições ou desejos, pois a inveja era um mal que vestia várias formas.

Segundo a psicologia, inveja é “O deslocamento de energia do potencial de determinado indivíduo para a exacerbada preocupação com a satisfação e prazer de outra pessoa, geralmente íntima do sujeito em questão”. Trata-se do desejo de atributos, posses, status ou habilidade de outras pessoas.

É um sentimento controverso, pois indica algo positivo que desperta algo negativo, e um dos mais difíceis de serem aceitos pelo ser humano, pois na maioria das vezes ocorre inconscientemente.

Tão antiga quanto a existência do próprio homem, os primeiros relatos de inveja vêm de tempos remotos. Na Bíblia a encontramos quando Caim assassina Abel, porque este estava recebendo mais atenção e valorização por parte dos pais.

Buscando compreendê-la, chegamos a um estudo feito em Tóquio, no Japão, pelo neurocientista Hidehiko Takanashi[2], do Instituto Nacional de Ciência Radiológica, chamado “Quando a sua conquista é a minha dor e a sua dor é a minha conquista”. Ele mostra que pessoas sentiam prazer ao despertar a inveja, o chamado schadenfreude[3], palavra alemã para a sensação de prazer que o invejoso tem ao notar o infortúnio do invejado. A inveja se processa no cérebro na mesma região que a dor física, ou seja, é literalmente um sentimento doloroso.

“Pessoas muito invejosas tendem a ter uma grande atividade nessa região do cérebro, que é responsável pela dor física e também é associada à dor mental”, contou o pesquisador à BBC Brasil. “Ao entendermos como funciona esse mecanismo neurocognitivo poderemos prevenir e tratar esse tipo de conduta”, concluiu.

A pesquisa, que durou um ano e meio, estudou o comportamento de 19 pessoas em boas condições de saúde. Durante os experimentos, elas tiveram os cérebros monitorados por aparelhos de ressonância magnética. As pessoas eram induzidas a imaginar um cenário que envolvia outras três personagens. Duas delas seriam hipoteticamente mais capazes e inteligentes do que os voluntários da pesquisa.

Quando os voluntários sentiam inveja, a parte do córtex dorsal anterior do cérebro era ativada. Takanashi concluiu em seu estudo que quando as pessoas sentiam schadenfreude, a região do estriado ventral do cérebro era ativada. Esta área é responsável por processar os sentimentos de prazer.

Concluindo, sob a óptica da pesquisa, a inveja também pode ser um dos motivos por que sentimos schadenfreude, já que queremos que o outro não tenha o que desejamos.

Essa conclusão coincide com as afirmações de Aristóteles[4], que dizia que a inveja é como a dor, quando vemos a boa sorte de outra pessoa, que é estimulada por “aqueles que têm o que deveríamos ter”.

Mas... essa inveja ou “olho gordo” pode de fato influenciar-nos?

A resposta sob a perspectiva espírita é sim, e podemos exemplificar com experiências efetuadas por William Tiller, chefe do departamento de Ciências dos Materiais em Stanford, que há décadas elabora experiências para verificar se as intenções humanas podem afetar os sistemas físicos. Para isso construiu um DERI; trata-se de uma caixa simples com diodos, um oscilador, uma memória programável, alguns resistores e capacitores. A caixa foi colocada em um local e ao seu redor ficaram quatro médiuns. Eles entraram em estado de meditação profunda, concentrando suas energias para a água. O objetivo era influenciar um experimento-alvo, específico: aumentar ou diminuir o pH da água; aumentar a atividade termodinâmica de uma enzima hepática.

Simplificando: os quatro médiuns se concentraram em uma caixa eletrônica simples e desejaram algo como mudar o pH da água ali contida. A probabilidade de isso acontecer naturalmente é menor que 1 para 1.000.

Os testes foram feitos por quatro meses, usando “caixas” diferentes a cada mês. Resultado: o pH da água mudou em todas as tentativas. Tiller afirma que se o pH do seu corpo mudar em uma unidade, você morre.[5]

O poder do pensamento, que é nossa força mental, pode ser arrasador. Na História, poderíamos aqui mencionar os essênios, vedas e até hindus a respeito de suas crenças sobre a capacidade do pensamento em atrair coisas boas ou ruins.

Para o Espiritismo, a capacidade do pensamento em atrair para si coisas boas ou ruins tem o nome de psicosfera[6], que quer dizer atmosfera psíquica, campo de irradiação do perispírito[7] que se exterioriza em redor do próprio organismo físico. Cada ideia ou força mental é, de alguma maneira, armazenada na psicosfera do fluido que circula em torno de nós. É assim que se constroem os pensamentos doentios, criadores de perturbações físicas diversas.

Dr. Jorge Andréa[8] informa: “Pensamentos, emoções e sentimentos harmoniosos contribuem para manutenção do equilíbrio e saúde física, mental e espiritual do ser humano. O contrário gera profundas disfunções e distonias causadoras de desequilíbrios, doenças e enfermidades, reversíveis ou irreversíveis, podendo contribuir significativamente para a instalação de um processo auto ou hetero-obsessivo. (...)”[9]

Allan Kardec, na questão 933 de O Livro dos Espíritos[10], completa: “Assim como, quase sempre, é o homem o causador de seus sofrimentos materiais, também o será de seus sofrimentos morais? — Mais ainda, porque os sofrimentos materiais algumas vezes independem da vontade; mas, o orgulho ferido, a ambição frustrada, a ansiedade da avareza, a inveja, o ciúme, todas as paixões, numa palavra, são torturas da alma. A inveja e o ciúme! Felizes os que desconhecem estes dois vermes roedores! Para aquele que a inveja e o ciúme atacam, não há calma, nem repouso possíveis. À sua frente, como fantasmas que lhe não dão tréguas e o perseguem até durante o sono, se levantam os objetos de sua cobiça, do seu ódio, do seu despeito. O invejoso e o ciumento vivem ardendo em contínua febre.” (Grifo nosso.)

Divaldo Franco nos brinda com essa afirmação: “Naturalmente a Doutrina Espírita examina a problemática do ponto de vista dos fenômenos anímicos. O denominado mau-olhado nada mais é do que uma intensa vibração mental de alguém que é dominado por sentimentos inferiores — a inveja, a competitividade — e ao descarregar esta onda de sentimentos negativos e vibrações perversas, muitas vezes atinge aquele contra o qual é dirigido esse pensamento perturbador. E atinge-o porque o outro se encontra numa faixa vibratória equivalente, e através do fenômeno da sintonia capta aquela descarga perturbadora.”[11]

Devemos também tomar cuidado com os nossos pensamentos a fim de que não tenhamos o “olho gordo” sob as pessoas que nos são próximas. A reforma íntima, o policiamento de nossos atos e pensamentos afastam os inimigos espirituais e encarnados e evita que sejamos “invejosos”.

 

  1. Expressão no senso comum que denomina inveja ou cobiça.
  2. Pesquisador-chefe do Departamento de Neuroimagem Molecular do Instituto Nacional de Ciência Radiológica, localizado no subúrbio da capital japonesa.
  3. Literalmente, alegria ao dano; é um empréstimo linguístico da língua alemã para designar o sentimento de alegria ou satisfação perante o dano ou infortúnio de um terceiro.
  4. Aristóteles foi um filósofo grego durante o período clássico na Grécia Antiga, fundador da escola peripatética e do Liceu, além de ter sido aluno de Platão e professor de Alexandre, o Grande.
  5. Informações referenciadas do livro Quem Somos Nós de William Arntz,. Cap. “O Domínio da Mente Sobre a Matéria” Tradução de Doralice Lima. Rio de Janeiro: Ed. Prestígio, 2005.
  6. Vem do grego psyché + sphaîra.
  7. Perispírito é o nome dado por Allan Kardec ao elo de ligação entre o Espírito e o corpo físico.
  8. Jorge Andréa dos Santos, nascido em 1916, em mais de meio século cruzou o país de norte a sul, fazendo palestras divulgando o Espiritismo em seu aspecto científico.
  9. ANDRÉA, Jorge. Contexto Espiritual nos Processos Mediúnicos e Obsessivos. in jornal “A Reencarnação”. n. 425 p.34/37. Porto Alegre: Ed. FERGS.
  10. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Rio de Janeiro: FEB, 2008.
  11. Frase retirada do programa “Transição”, número 007, de 23.11.2008, disponível no site http://www.kardec.tv/, com o médium Divaldo Pereira Franco explicando sobre o tema mau-olhado e feitiçaria.

fevereiro | 2022

MATÉRIA DE CAPA

RIE – fevereiro/2022

Sobre a inveja, um sentimento que nos atrasa espiritualmente

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 Carta ao Leitor – fevereiro/2022

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 Caixa de vibrações: solução dos problemas?

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 Cuidado com o “olho gordo”

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