Janeiro | 2022

“Entre verdadeiros espíritas (...) reina um sentimento de confiança e de benevolência recíproca” (Allan Kardec)

De que lado está a verdade?

Maroísa F. Pellegrini Baio

maroisafpb@gmail.com

O espírita cristão saberá como e onde encontrá-la!

 

Allan Kardec não atuava como palestrante espírita. Ele discursava apenas em ocasiões especiais tais como: a abertura de um novo ano social da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, um ano especial sobre as publicações da Revista Espírita, nos grupos espíritas de outras cidades por ele visitados no período de 1860 a 1862. Seus discursos são de grande valia, pois mostram sua vivência pessoal em relação ao Espiritismo e ao movimento espírita do século XIX.

Ainda tomando por base o discurso proferido entre os espíritas da cidade de Bordeaux, publicado na Revista Espírita de novembro de 1861, ele toca num assunto que ainda se apresenta em nossa época: a divergência de entendimento sobre alguma instrução doutrinária, causa essa de vários desentendimentos entre os próprios espíritas. Ele mesmo lançou a questão: “Se as opiniões estão divididas sobre alguns pontos da Doutrina, como saber de que lado está a verdade?” Sua resposta surpreende pela lógica simples:

“É a coisa mais fácil. Para começar, tendes por peso o vosso julgamento e por medida a lógica sã e inflexível. Depois, tereis o assentimento da maioria; porque, acreditai, o número crescente ou decrescente dos partidários de uma ideia dá a medida de seu valor; se ela fosse falsa, não conquistaria mais adeptos do que a verdade; Deus não o permitiria; Ele pode deixar que o erro surja aqui e ali, para nos fazer ver suas atitudes e nos ensinar a reconhecê-lo. Sem isto, onde estaria o nosso mérito, se não tivéssemos escolha a fazer?”

Ele também apresenta outro critério, mais belo e profundo:

“Quereis um outro critério da verdade? Eis um, infalível. Desde que a divisa do Espiritismo é Amor e Caridade, reconhecereis a verdade pela prática desta máxima, e tereis como certo que aquele que atira a pedra em outro não pode estar com a verdade absoluta. Quanto a mim, senhores, ouvistes a minha profissão de fé. Se — o que Deus não permita — surgissem dissidências entre vós, digo-o com pesar, eu me separaria abertamente dos que desertassem da bandeira da fraternidade, porque, aos meus olhos, não poderiam ser olhados como verdadeiros espíritas.”

Suas orientações, mesmo em torno dos problemas mais complexos, como a questão das dissidências entre os espíritas, se caracterizavam sempre pela lógica apoiada na caridade e na simplicidade:

“Em todo caso, não vos inquieteis absolutamente com algumas dissidências passageiras: em breve tereis a prova de que elas não têm consequências graves. São provas para a vossa fé e para o vosso julgamento; muitas vezes são meios permitidos por Deus e pelos Bons Espíritos para dar a medida da sinceridade e dar a conhecer aqueles com os quais realmente se pode contar, caso necessário, e que assim evitamos colocar na vanguarda. São pequenas pedras semeadas em vosso caminho, a fim de vos habituar a ver em que vos apoiais.”

Segundo ele, esse mesmo critério, baseado no amor e na caridade, é a melhor oposição aos adversários do Espiritismo, aos quais ele classifica em duas ordens: a dos zombadores e incrédulos e a dos interessados em combater a Doutrina. Em relação aos primeiros, Kardec aconselha: “Não os temeis, porque tendes razão. Sem o querer, servem à nossa causa e lhes devemos agradecer.” Já em relação aos segundos, afirma: “(...) são cegos porque não querem ver. Não vos atacam porque estejais no erro, mas porque estais com a verdade e, com ou sem razão, creem que o Espiritismo seja prejudicial aos seus interesses materiais.” Nota-se aqui sua serenidade firme perante os inimigos da Doutrina, estejam eles encarnados ou desencarnados.

Destacou também que em torno dessa bandeira devem reunir-se os verdadeiros espíritas, aos quais ele denomina de espíritas cristãos: “Convencidos de que a existência na Terra é uma prova passageira, tratam de aproveitar estes curtos instantes para avançar na via do progresso, esforçando-se por fazer o bem e reprimir suas más inclinações; suas relações são sempre seguras, porque a convicção os afasta de todo mau pensamento. Em tudo a caridade é sua regra de conduta.” (Revista Espírita, dezembro de 1861.)

Continuando seus comentários, ele ressalta que um grupo formado somente por espíritas dessa categoria seria o ideal: “(...) entre praticantes da lei de amor e caridade é que se pode estabelecer uma séria ligação fraternal. Entre homens para quem a moral é mera teoria, a união não seria durável; como não impõem nenhum freio ao orgulho, à ambição, à vaidade e ao egoísmo, não o imporão também às suas palavras; quererão primar, quando deveriam descer; irritar-se-ão com as contradições e não terão escrúpulos em semear a perturbação e a discórdia. Entre verdadeiros espíritas, ao contrário, reina um sentimento de confiança e de benevolência recíproca; sentem-se à vontade nesse meio simpático, ao passo que há constrangimento e ansiedade num ambiente misto.”

*

Dois critérios imbatíveis: o bom senso e a caridade! Embora suas orientações tenham sido dirigidas em especial aos espíritas daquelas regiões e daquela época, elas continuam válidas, na atualidade, para todo aquele que queira pautar sua conduta agindo sempre lado a lado com a verdade, lado a lado com Jesus!

Diante de Pilatos, Jesus afirmou: “Quem é da verdade escuta minha voz” (João, 18:37). Afinemos nossos ouvidos para registrar os ensinamentos do Mestre! Sua voz continua ecoando pelos séculos, buscando ressonância em nossos corações! Com Ele, a certeza de estarmos no caminho certo, do lado certo, do lado da verdade!

janeiro | 2022

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