
Katie King e as pesquisas de William Crookes
Orson Peter Carrara
orsonpeter92@gmail.com
Entrevista com Nelson Xavier da Silva
Obstinado a desacreditar os fenômenos espirituais, constatou sua veracidade e dedicou-se com afinco e rigor científico a estudá-los
Espírita desde 1994, natural de Barbacena (MG) e atualmente residente em Pirassununga (SP), com Licenciatura em Pedagogia e Consultor em Desenvolvimento Humano, Nelson Xavier da Silva é Oficial da Aeronáutica e ativo participante do Grupo de Estudos Espíritas Allan Kardec, na cidade onde reside. Coordenador de estudos e palestrante espírita, fala-nos sobre a obra do cientista William Crookes, cujo centenário de desencarnação verificou-se em abril de 2019.
RIE. Considerando o centenário de desencarnação de William Crookes ocorrido em 2019, situe para o leitor esse importante vulto da história humana.
Nelson Xavier da Silva. Sir William Crookes, químico inglês, que também foi um dos mais persistentes pesquisadores dos fenômenos espirituais, nasceu em Londres no dia 17 de junho de 1832 e desencarnou em 4 de abril de 1919, na mesma cidade. Depois de assumir a cadeira de Química na Universidade de Chester, descobriu os raios catódicos, isolou o tálio, descobriu a aparente ação repulsiva dos raios luminosos, o que o levou à construção do radiômetro. Desenvolveu sérios trabalhos sobre a medida da intensidade da luz e engenhosos instrumentos: o fotômetro de polarização e o microscópico espectral, e descobriu também o quarto estado da matéria, o estado radiante, além de fazer destacadas descobertas no campo da Física e da Química. Entrementes, para nós espíritas, seu trabalho foi sem igual. Intentado inicialmente a demonstrar os equívocos que supostamente envolviam os fatos espíritas, dedicou-se com afinco à observação dos fenômenos mediúnicos e realizou inigualável trabalho para a ciência espírita, demonstrando a veracidade daquilo que parecia improvável ou fraudulento. Mesmo sob o açoite da zombaria, permaneceu firme em seus apontamentos relativos aos fatos espíritas.
RIE. O importante livro Fatos Espíritas narra as experiências do ilustre cientista. Que aspecto do livro destaca para o leitor?
Nelson. Sabe-se que em 1869 os médiuns J. J. Morse e Sra. Marshall serviram de instrumento para que Crookes realizasse suas primeiras investigações, mas foi com a médium de efeitos físicos Florence Cook, quando obteve as materializações do Espírito que declarava chamar-se Katie King, que William Crookes alcançou as mais notáveis experiências mediúnicas, fato que abalou o mundo científico da época. Quando um homem, reconhecidamente voltado para a ciência, dedica-se com seriedade e método a escancarar a verdade e chega à conclusão de que as aparições, as visões, as materializações, enfim, as comunicações com o mundo invisível, são algo real e possível, fortalecem-se os laços da fé. Já não é apenas o aspecto místico e religioso que se destaca mas, sim, a ciência humana que começa a tirar o véu das realidades espirituais. O livro realça os métodos usados na pesquisa dos fenômenos produzidos pela médium Florence Cook, o desenvolvimento de teorias que visavam a explicar o fenômeno, bem como a opinião de outros pesquisadores. Podemos ressaltar no livro a forma detalhada com que o pesquisador demonstra seu método e toda a sua preocupação em cercar o fenômeno e impedir que ali houvesse fraude.
RIE. Que critérios utilizou o cientista em suas pesquisas?
Nelson. As sessões eram feitas no escuro, para facilitar o chamado fenômeno de ectoplasmia, mas ocasionalmente se davam sob uma luz vermelha, quando para obtenção de fotografias. Crookes, além de seus familiares e outros pesquisadores de sua confiança, pôde constatar as diferenças físicas entre a médium e o Espírito materializado (pele, mãos, altura, cicatrizes, vestuário, cor de cabelo, marcações no corpo etc.) e registrar a materialização do Espírito através de câmera fotográfica. O pesquisador analisou as pulsações cardíacas e auscultou o coração da médium e de Katie King materializada. Ao analisar os pulmões das duas, verificou que os de Katie mostraram-se mais sãos do que os da médium, pois, no momento da experiência, a Srta. Cook seguia tratamento médico por motivo de grave bronquite. William Crookes presenciou a despedida do Espírito materializado com a médium fora do transe mediúnico. Ambas eram visíveis ao mesmo tempo, o que descarta a desconfiança de que a médium pudesse assumir o papel da forma espiritual materializada.
RIE. Fale sobre o Espírito alvo das pesquisas.
Nelson. Katie King dizia ter sido filha, em uma outra reencarnação, de Henry Owen Morgan, que se comunicava com o nome de John King (célebre pirata do Caribe e que foi feito cavalheiro e nomeado governador da Jamaica por Charles II). John King afirmava que Annie Owen Morgan (o verdadeiro nome de Katie King) era uma de suas filhas ilegítimas. Katie King era vista quase que diariamente pela médium Florence. Era uma habitante permanente da casa dos Cook. Segundo relatos, Katie era uma linda jovem, que William Crookes conseguiu fotografar quarenta vezes. Por sua vez, Florence Cook tinha apenas 15 anos de idade quando se apresentou para servir de medianeira nas pesquisas científicas que vinham sendo realizadas. No dia 22 de abril de 1872 aconteceu pela primeira vez a materialização de Katie King, estando presente na sessão a genitora, alguns irmãos da médium e a criada.
RIE. Que repercussões tiveram as pesquisas de Sir Crookes?
Nelson. Charles Richet divide a evolução histórica dos fenômenos parapsíquicos no Ocidente em quatro períodos e chama o quarto de Período Científico, que se inicia a partir de 1872 com as pesquisas de William Crookes, subdivididas em: período metapsíquico (1872 a 1930) e período parapsicológico (de 1930 aos dias atuais). O trabalho de Crookes abriu as portas para uma nova fase da pesquisa sobre a vida imortal. A comunicação com os mortos virou ciência e a nova doutrina fascinou o meio intelectual, artístico e científico injetando novo ânimo para uma nova perspectiva de vida.
RIE. De seus estudos sobre esse tema, o que mais lhe chama atenção?
Nelson. É importante notar que havia uma expectativa muito grande do mundo científico — criada a partir do anúncio do Quartely Journal, segundo o qual Crookes iria dedicar-se aos fenômenos denominados espíritas — na esperança de que o eminente cientista pudesse desmascarar a crendice instituída por estes ditos Espíritos. Contudo, seguindo na contramão do que se esperava, o pensamento científico de Crookes cedeu ao incontestável e ele afirmou a autenticidade dos fenômenos espíritas. Após as primeiras publicações das observações do eminente cientista, que observou, pesou, mediu, registrou, houve por parte de alguns a aceitação imediata, enquanto outros mantiveram-se na negação insistente e nos ataques de reprovação ao trabalho de William Crookes. A persistência em busca da verdade, mesmo diante da insatisfação de muitos, mostra o caráter sério do professor William Crookes. Quantos abandonaram a divulgação da verdade para desfrutarem de aceitação nos meios em que ansiavam ser valorizados? Apresentar uma verdade que se oponha ao que a massa aceita traz sérias consequências, cuja reparação só virá com o decurso do tempo.
RIE. Você considera que as pesquisas narradas no livro citado acima repercutiram efetivamente no meio científico, inclusive nos dias atuais?
Nelson. Sim. Sua repercussão foi inegável, tanto é que, após Crookes, muitos cientistas se dedicaram aos estudos do fenômeno espírita. Percebo que, embora ainda haja muita descrença e pouca coesão nos estudos científicos dessas matérias, paralelamente há indivíduos sérios em busca da verdade. Acredito que o tempo irá indicar-nos o caminho, corrigindo os erros e ajudando-nos a valorizar os acertos de nossa acanhada ciência. Também reafirmo essa crença, com fundamento na promessa do Mestre Galileu: buscai e achareis... Quando um cientista de renome, dedicando-se aos estudos dos fenômenos espirituais, acaba por afirmar a sua veracidade, decorre que a curiosidade, o desejo de desmascarar (ou confirmar) a existência do mundo extrafísico, ou até mesmo a vontade de aplicar seus próprios métodos, faz com que outros cientistas também se dediquem à investigação de tais fenômenos. Por exemplo, estudos acadêmicos tentam não só demonstrar a relação da fé na cura de doenças, a ação benéfica dos passes, a existência da alma, a aparição de seres extracorpóreos, a comunicação mediúnica, como também identificar até mesmo apontamentos realizados pelos Espíritos nas últimas décadas, muito à frente de seu tempo, e cuja veracidade somos atualmente capazes de verificar.
RIE. Que homenagem podemos prestar ao notável pesquisador neste momento em que já ultrapassamos o centenário de sua desencarnação?
Nelson. É grato ao coração lembrar que, mesmo sob a injunção do sarcasmo, da ironia e da perseguição realizada pelos inimigos do Espiritismo e da verdade, Crookes permaneceu fiel ao seu papel de cientista. Fez-me entender que temos um compromisso moral com nossa consciência e não com a opinião que outros formarão sobre nós. William Crookes foi um homem honesto, destemido, perseverante, alguém que se comprometeu com o bem — um verdadeiro exemplo a ser seguido. Seu discurso na Associação Britânica pelo Avanço da Ciência, em 1898, merece destaque: “Trinta anos se passaram desde que publiquei um relatório de experiências tentando mostrar que, além do conhecimento científico que possuímos, existem forças exercidas por inteligências diferentes da inteligência comum dos mortais... Nada tenho a me retratar. Confirmo minhas declarações já publicadas. Na verdade, muito teria que acrescentar a isso!” Tenho certeza, pois, de que onde ele estiver estará carregando a certeza da missão cumprida. Seu legado continua e que possamos nós imitar suas virtudes. Cabe-nos dizer: — Sir William Crookes, muito obrigado por seu tempo e sua dedicação. Que a verdade seja a nossa meta e que o Senhor da Vida nos abra os horizontes da mente e do coração para que possamos nos expandir em busca do infinito.
RIE. Suas palavras finais.
Nelson. Primeiramente tenho de agradecer a oportunidade desta entrevista, recordando que, nas minhas primeiras horas do estudo do Espiritismo, as pesquisas realizadas por Crookes me deram forças e a certeza da imortalidade da alma e a possibilidade da comunicação com os ditos mortos. William Crookes, ao constatar que os casos pesquisados por ele eram verídicos e inegáveis, acabou por render-se às evidências, tornando-se espírita e afirmando: “Não digo que isto é possível; digo: isto é real!”
- Nota da Redação: entrevista originariamente publicada na revista eletrônica O Consolador, adaptada para esta edição.
fevereiro | 2020
MATÉRIA DE CAPA
RIE – fevereiro/2020
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