Julho | 2019

Vida extraterrestre

Luciano Souza Novais

lucianosouzanovais@yahoo.com.br

Uma visão do Espiritismo e da ciência contemporânea

 

A Doutrina Espírita, no seu tríplice aspecto, gravita pelos caminhos da razão. Como tal, entende o Universo como um incomensurável desconhecido que não se delineia exclusivamente pelos caprichos humanos. Está muito além, embora os incansáveis esforços científicos para desbravá-lo e compreendê-lo. Sendo a lei da Pluralidade dos Mundos Habitados um dos pilares doutrinários do Espiritismo, é evidente que a vida, dentro do contexto espírita, se processa em toda parte, numa constante cósmica.

Por essa razão, o elo de interesse comum entre ciência e espiritualidade será o Espiritismo, que muito contribuirá para a ciência tradicional entrevendo a vida na Terra e no Universo longe do paradigma materialista. Ainda que nosso aparelhamento sensorial atingisse exclusivamente os fenômenos materiais dentro das fronteiras em que vivemos, limitando a captação de outros níveis de ondas, isso não restringe a hipótese de haver mundos com seres organizados, e muito mais adiantados, espalhados pelo Universo imperceptível ao nosso olhar imediato. Essa consciência oportuniza novos meios de observação sem os quais se tornariam restritas as especulações sobre os extraterrestres.

Contudo, mediante as tecnologias mais sensíveis e conhecimentos inovadores no campo da matéria e energia escura, dos multiversos e exoplanetas, da comprovação dos buracos negros prevista por Einstein e, claro, da revisão conceitual do nosso próprio sistema solar, a Humanidade tem-se dado conta de que a vida é muito mais que um emaranhado de estruturas biológicas e compostos químicos. Daí o interesse em pesquisar os mundos não somente como candidatos a abrigarem vida material, mas aceitando-a também em outros planos vibratórios que se sobrepõem e interpenetram em incontáveis modulações e graus energéticos capazes de sustentar facetas alternativas da vida.

Até não muito tempo atrás, acreditava-se que pouquíssimos lugares no cosmos seriam convenientes ao desenvolvimento de organismos. Hoje, diferentes segmentos rebatem esse pensamento que buscava associar os elementos da vida a formações além da nossa compreensão, levando-nos a crer ser improvável ir a outro planeta e admitindo-o tão somente desértico ou desprovido de vida, mesmo que microscópica. Com as revoluções no campo da astrofísica, astronomia e bioquímica, estima-se haver estações onde os elementos do progresso são proporcionais ao adiantamento de cada criatura. Neste contexto, aguarda-se ansiosamente o anúncio da grande descoberta.

Para o Espiritismo, isso não é ficção e o auspicioso surgimento da vida não é obra do acaso, nem se limita a um reduto seleto. É fato testemunhado pelos Espíritos, através do intercâmbio mediúnico na Codificação Kardequiana, e igualmente aceito pelo avanço científico que entrevê a possibilidade de vida extraterrena. Até a insensatez humana em crer que tudo no Universo foi criado somente para agradar-lhe aos olhos faz-nos refletir sobre o assunto, pois a opinião social já não aceita esse pensamento tacanho.

Por consequência disto, surgiu a exobiologia, braço multidisciplinar da biologia que tem adquirido significância no cenário mundial, e cujo objetivo é procurar por planetas potencialmente habitáveis e por possíveis meios que serão úteis para o reconhecimento de biosferas, similares ou mesmo diferentes aos padrões humanos. Os exobiólogos estão convictos de que a vida extraterrestre pode apresentar-se de incontáveis maneiras, embora pareça ser rara no Universo. Segundo dizem, o exemplo parte da própria Terra, composta de inúmeras espécies animais, das quais somente uma tem inteligência.

Outra investigação astrofísica é corroborada pelos exobiólogos ao obter, através da luz espectral originária das nuvens de poeira cósmica exposta em sua base, cerca de 150 variedades de moléculas orgânicas ou elementos químicos ativos. Se houver planetas ou luas em condições de abrigar alguma reação química ideal, com a presença de elementos essenciais como água e compostos de carbono, provavelmente ter-se-á a formação de células, cromossomos e, quem sabe, outros organismos. Basta observar como foi o início geológico e bioquímico terrestre, cerca de 4,5 bilhões de anos atrás, para entender o processo.

Mas seriam estes elementos físicos os primordiais para desencadear a vida? Não haveria outros meios capazes de promover o surgimento do que chamamos vida? Para o Espiritismo, isso é viável, uma vez que cada mundo é constituído por “matéria” do seu meio, não sendo a vida pelos moldes do nosso planeta, portanto, uma regra. Há diversidade de padrões na constituição física dos mundos, existindo desde seres materialmente detectáveis até aqueles formados por um tipo de matéria quintessenciada, que nos escapa à observação direta, abrangendo as múltiplas dimensões da Criação.

Um exemplo adicional dessa nova concepção científica, disposta a abraçar novas perspectivas de análise, advém do discurso da astrônoma chilena María Teresa Ruiz, primeira mulher a graduar-se em Astronomia no Chile e presidir a Academia de Ciências daquele país. Ao receber o prêmio For Women in Science em Paris, disse ela sobre a admissível vida extraterrestre: “Seria muito estranho que não houvesse, existindo tantas estrelas na galáxia e tantas galáxias no Universo. Pode ser uma vida um pouco diferente da nossa, mas eu acredito que haja.” Segundo avalia, a descoberta de vida de qualquer conformação mudará nosso olhar sobre a Humanidade, porquanto uma coisa é suspeitar e outra muito distinta é comprovar. Entretanto, tudo ainda é condicionado à concepção da vida na dimensão humana, embora esse raciocínio tenha sofrido modificações que retiraram aquela concepção de seus antigos limites.

Mas... o que é vida? Defini-la implica questões cujas proposições afetam diversos ramos do conhecimento. Na acepção geral, as pessoas entendem-na como o desfrutar das boas coisas, estar em família, possuir condição razoável de sobrevivência ou relacionar-se bem com os demais. Para a ciência, existem outros critérios sistêmicos capazes de detectá-la diversamente daquele onde seu sentido, significado, origem, propósito e destino final estão entrelaçados às visões filosóficas, religiosas e de ideação comum. No Espiritismo, a vida se expande numa profusão infinita de compostos e formas.

O assunto é antigo e polêmico, sendo discutido desde a velha Grécia. Epicuro declarava existirem no cosmos mundos parecidos com a Terra e o poeta Titus Lucretio defendia igual certeza. Luciano de Samósata, filósofo e escritor de origem semita, narra intrigante viagem ficcional à Lua, mencionando a existência de vida extraterrena. No século XV, o Cardeal Nikolaus, apoiado pelo Papa Eugênio IV, propagava a existência de mundos habitados circundando seus sistemas pelo Universo afora.

Por último, o italiano Giordano Bruno, ao assegurar a pluralidade dos mundos habitados, contrariou o pensamento aristotélico defendido pela Igreja. Apaixonado pela imensidão do Universo dizia: “Há incontáveis terras orbitando em volta de seus sóis como ocorre no nosso sistema solar.” Por declarar ideia subversiva e herética, teve destino trágico: foi julgado em processo inquisitorial e condenado à fogueira em fevereiro de 1600.

No correr dos séculos, a ciência tem feito os dogmas teológicos sofrerem renovação conceitual. Hoje se encara a vida no cosmos como mais uma comprovação da ação de Deus e não sua negação. Isso ocorre porque, para os teólogos contemporâneos, a crença em Deus parte da premissa de que toda forma de vida é obra divina. A existência de seres em outros planetas torna-se uma hipótese aceitável. Logo, a nova ordem explora e avalia o caráter da mediação universal do Cristo em relação aos possíveis extraterrestres pela máxima Evangélica: “Na casa de Meu pai há muitas Moradas. Se assim não fosse, eu vo-lo teria dito...” (Jo, XIV: 12-3). Por sua vez, o Espiritismo aprova a vida em todo canto, inclusive nos espaços sidéreos e após a morte do corpo físico. Isso alenta a humanidade, que se crê solitária nesse grande mar de estrelas, mundos e dimensões incontáveis.

Allan Kardec também diz: “A Casa do Pai é o Universo. As diferentes moradas são os mundos que circulam no espaço infinito e oferecem aos Espíritos estâncias adequadas ao seu adiantamento.” A Terra pertence à categoria dos mundos de provas e expiações, sujeita às adversidades. O certo é que a vida acontece em diversos estágios e a ciência comum, de mãos dadas com a Doutrina Espírita, a enxergará sem fragmentações. Nas formações grosseiras, nos organismos microscópicos, nas estruturas elaboradas onde a racionalidade aparece, até nas dimensões mais sutis do espiritual, permanecerá a certeza de que Deus nada faz sem uma finalidade útil.

O ser humano, longe de ser uma exceção, se reconhecerá herdeiro da Criação Divina, já que aceitará a vida como um “processo extremamente complexo” e não apenas uma substância pura, já pronta. Do macro ao microcosmo, tudo será avaliado como resultado direto dos estágios espirituais, matriz geradora da matéria em qualquer manifestação. Nesse dia, não muito distante, a vida extraterrestre alargará a nossa percepção ao ser detectada totalmente díspar do encontrado na Terra, mesmo em modelos que jamais acreditaríamos existir. Até lá, importa irromper barreiras na confiança de que, melhorando nosso íntimo e retificando nossas falhas e imperfeições, aprimoramos nossos Espíritos em múltiplas e sucessivas existências, na Terra ou fora dela, subindo na escala evolutiva ao transitar pelo cosmos e aceitando plenamente a vida como profusa bondade de Deus.

 

  1. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Cap. III, questões 55 a 58. FEB.
  2. KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Cap. III. FEB.
  3. KARDEC, Allan. Revista Espírita. Março de 1868. FEB.
  4. Revista Espírita Allan Kardec. Ano III, n. 11. Goiânia, fevereiro/abril de 1991.
  5. Revista Internacional de Espiritismo (RIE). n. 10, novembro de 1996.
  6. TV BAND, Canal Livre. Entrevista com o astrofísico Marcelo Gleiser em 7 de julho de 2016.
  7. TV CULTURA, Matéria de Capa — Alienígenas, em 8 de julho de 2018.

agosto | 2019

MATÉRIA DE CAPA

RIE – agosto/2019

A pluralidade dos mundos habitados palpita curiosidade e investigações científicas sobre as sutilezas da matéria conforme a evolução.

Lista completa de matérias

 Pela transparência

 Vida extraterrestre – Carta ao Leitor

 Anulação do passado

 Ciência, religiosidade e espiritualidade em conexão

 Reflexões sobre o controle universal do ensino dos Espíritos

 Administrar o tempo é administrar a própria vida

 Energias psíquicas e meio ambiente

 O Espiritismo não se deitará no leito de Procusto

 Mediunidade: compromisso iluminativo

 Médiuns precursores

 Vida extraterrestre

 Conflitos sexuais na adolescência

 A Igreja de Laodiceia — A Sétima Carta do Apocalipse

 A internet e a pornografia

 Léon Denis: continuador de Kardec

 O mundo supranormal

 Todos pelo bem

 Base para interpretação das profecias

 Instruções sobre as preces

 Simulando uma entrevista

 Notícias e eventos – agosto/2019

 3º CONJEBRAS aborda novos conceitos de família

 A beleza da convivência